Eu já morava aqui em Londres na época das Diretas Já, mas acompanhava de longe como podia, sobretudo por ser a continuação dos meus otimistas “anos trotskistas” – a grande greve de seis meses da ECA em 1975, mais tarde as greves dos metalúrgicos do ABC, na segunda metade dos anos 70 (eu era correspondente da Folha em Sto. André) e, depois, a histórica primeira greve dos jornalistas paulistas, quando eu trabalhava na Agência Folha, com Mario Sergio Conti (também ativo na greve da ECA, como estudante) e minha queridíssima amiga Regina Cardeal. Logo depois da greve dos jornalistas, vim para cá, “cruzando no meio do oceano” com os exilados que retornavam, o tal do verão do retorno. A coincidência foi eu estar presente na gigantesca manifestação pelas Diretas na Pça da Sé em SP, numa das minhas visitas ao Brasil naquele ano.
Quanto às Diretas, um pequeno comentário. Majoritariamente, as análises históricas daquela campanha usam material de referência das coberturas feitas na época pela grande mídia. E o inevitável acontece: acabam retratando para o futuro a campanha como sendo iniciativa dos políticos medalhões liberais. Meu ângulo é um pouco diferente, se minha memória não falha. Aqueles medalhões simplesmente e oportunisticamente (porém corretamente) oficializaram e expandiram a ideia das Diretas, com base na direção em que o vento soprava: seguiam o que já estava sendo exigido pelos grupos underground de esquerda havia bastante tempo, esses sempre na vanguarda, a vários passos à frente do status quo político. Na minha mente, essa é a História daquele período, já que considero que a verdade está sempre nas raízes. As flores, folhas e frutos são o arco-íris para os olhos, mas não nasceram primeiro.
Cláudio Solano, jornalista, Londres
No comício da praça da Sé, em 25 de janeiro de 1984, Lula estava a caminho do palanque quando fiz essa foto. Leia na sua camisa: “Presidente quem escolhe é a gente”. Rima fácil, de inteireza completa e objetiva. Mas quem é essa gente que escolhe o presidente?
Paulo de Tarso Siqueira Abrão, advogado, São Paulo.
Em 1984 eu tinha 15 anos e estudava no Colégio Batista numa classe de mais de quarenta alunos. A maioria não se interessava muito por política apesar das manifestações pelas Diretas Já estarem acontecendo fortemente em todo o país. Eu e meu colega Marcello éramos exceção. Fomos ao comício da Praça da Sé e ao do Anhangabaú – este, histórico pelo mar de gente que se espalhou pelo vale. Osmar Santos era o mestre de cerimônia. Presentes, as principais lideranças da oposição (ao governo federal). Brizola, Lula, Fernando Henrique, Tancredo, Covas, Ulysses Guimarães, Montoro entre outros. Jogadores de futebol, artistas.
Na hora do Hino Nacional, me chamou a atenção uma estudante de seus vinte e poucos anos com uma faixa na testa escrita Diretas Já, cantando bem alto. De punho erguido e olhos cerrados, chorava de emoção. Eu, colegial mais novo, me emocionei junto e entendi que estava vivendo a História.
Oswaldo Bosbah, músico, São Paulo.
No dia 28 de janeiro de 1984, estava bem longe da praça da Sé, onde ocorreu três dias antes o primeiro comício das Diretas Já. Naquele verão, passava férias no Ceará e, após uma temporada na então desconhecida Jericoacoara, fiz minha última parada na capital cearense, coincidentemente no dia em que a população lotou a praça José de Alencar. Era muita gente e confesso que lembro de poucos detalhes, como ter visto ao meu lado um apressado Raimundo Fagner indo rumo ao palanque, no qual estavam Lula, Brizola e Ulysses Guimarães. O clima era festivo, muitas bandeiras e uma energia libertária carregada de esperança. Pela TV quase nada soube do comício de São Paulo. Não tenho certeza, mas acho que Fortaleza foi realmente o lugar que desencadeou a faísca. Na época, andava acompanhado de uma Olympus Trip, da qual nunca me desfiz por razões afetivas. Como filme era carooo pra cacete e eu era um durango, não fiz fotos do comício, mas peguei um cartaz surpreendentemente preservado até hoje. Ao resgata-lo literalmente do meu baú, vieram juntas um punhado de lembranças gostosas. "Eu tenho a mão que aperreia/Eu tenho o sol e areia/Sou da América, sul da América/South America/Eu sou a nata do lixo, eu sou do luxo da aldeia/Eu sou do Ceará"
Guilherme Meirelles, jornalista, São Paulo